Semana passada um deputado ressuscitou a Tchu tchuca e o Tigrão. Dá pra discutir várias coisas sobre esse episódio, mas o que eu quero destacar é a deriva de sentidos e a memória, fazendo uma abordagem, portanto, da Análise do Discurso.
Eu não sei exatamente se o termo Tchu tchuca já existia antes da música do Bonde do Tigrão. Se alguém tiver informações (e memória) sobre isso, me ajude. Tendo existido esse termo antes, penso que ele tinha uma vida bastante restrita a certos ambientes, certa cultura. É um termo que se liga(va) à cultura do funk, do baile e tal. Com a música, lançada em 2001, a Tchutchuca ganhou o mundo. Goste você ou não. (Óbviamente não vou sequer pensar na discussão de ‘ainnn isso não é cultura’. É sim!)
O sentido, àquelas alturas quando do lançamento da música, era muito mais relativo à menina, jovem, bonita, disponível, que dança, que vai até o chão. Chão, chão, chão, aliás, também ganhou vida quando o funk passou a circular em outras áreas, e descolou-se só do funk pra querer dizer alguma coisa do tipo uhuuul. Acho. Não sei bem. Mas, enfim, a gente usa e todo mundo (falante de PTBR, de certa faixa etária etc) sabe o que quer dizer.
Assim como Tchutchuca. O sentido pode ser carinhoso, tipo querida; pode ser elogioso, tipo bonita; pode ser meio pejorativo, tipo escandalosa; pode ser irônico; pode ser provocativo; pode ser ofensivo. Pode ser um monte de coisas. Vai depender, basicamente, do contrato entre os interactantes, da situação de uso e da intenção comunicativa. Era aqui que eu queria chegar.
O significado primeiro, na verdade, já está longe, quase perdido, mas a deriva do sentido vai dando à expressão novos usos, novos traços de sentido, permitindo com circule em outros ambientes, outras culturas. Até chegar, como vimos, no congresso, com um sentido bastante, digamos, peculiar. Criando-se ali a oposição entre a Tchu tchuca e o Tigrão, oposição que não está no sentido original, longe disso, mas é absolutamente razoável e possível pensando na deriva dos sentidos. Tanto assim que aconteceu e todo mundo entendeu o novo sentido imediatamente.
A memória, portanto, vai sendo atualizada a cada ocorrência de um novo sentido, deslocando-se daqui prali, ajustando-se e produzindo efeitos de sentidos diferentes do que antes.